terça-feira, 17 de setembro de 2013

Os atos de justiça de um crente são trapos imundos?



por Kevin DeYoung

Muitos são os cristãos que creem que todos os seus atos justos não passam de trapos imundos. Afinal, é o que Isaías 64.6 parece dizer: até mesmo nossos melhores feitos são imundos e destituídos de valor. Mas não penso ser isso que Isaías quis dizer. Os “atos de justiça” que Isaías tinha em mente eram, muito provavelmente, os rituais superficiais oferecidos por Israel, desprovidos de uma fé e de uma obediência sinceras. Em Isaías 65.1-7, o Senhor rejeita os sacrifícios pecaminosos de Israel. Eles são um insulto ao Senhor, fumaça para seu nariz, assim como a “obediência” ritualista de Isaías 58 não impressionou ao Senhor porque seu povo continuava oprimindo o pobre. Os “atos de justiça” eram “trapos imundos” porque não eram nem um pouco justos. Tinham aparência boa, mas não passavam de farsa, literalmente uma cortina de fumaça para acobertar a incredulidade e a desobediência deles.

Por isso, não deveríamos pensar que todo “ato de justiça” nosso é como trapos imundos aos olhos de Deus. Aliás, no versículo anterior, Isaías 64.5, Isaías declara: “Vens ajudar aqueles que praticam a justiça com alegria, que se lembram de ti e dos teus caminhos”. Não é impossível o povo de Deus praticar atos de justiça que agradam a Deus. John Piper explica:

“Às vezes as pessoas são descuidadas e falam de forma negligente sobre toda a justiça humana, como se não houvesse nada que agradasse a Deus. Muitas vezes elas citam Isaías 64.6 que diz que nossa justiça é como ‘trapo de imundícia’. É verdadeiro – gloriosamente verdadeiro – que ninguém do povo de Deus, antes ou depois da cruz, seria aceito pelo Deus imaculadamente santo se a justiça perfeita de Cristo não nos fosse imputada (Romanos 5.19; 1 Coríntios 1.30; 2 Coríntios 5.21). Mas isso não quer dizer que Deus não produza nessas pessoas ‘justificadas’ (antes e depois da cruz) uma justiça experiencial que não é ‘trapo de imundícia’. Ao contrário, ele o faz; e essa justiça é preciosa a Deus e é exigida, não comofundamento da justificação (que é a justiça de Cristo somente) mas como evidência de sermos filhos verdadeiramente justificados de Deus”.[1]

É perigoso ignorar-se a suposição, e expectativa, da Bíblia, de que a justiça é possível. É claro que nossa justiça jamais é capaz de aplacar a ira de Deus. Precisamos da justiça imputada de Cristo para isso. Tem mais: não temos como produzir justiça em nossa própria força. Mas como crentes nascidos de novo, é possível agradarmos a Deus por meio de sua graça. Os que geram fruto em cada boa obra e crescem no conhecimento de Deus são totalmente agradáveis a Deus (Cl 1.10). Apresentar nosso corpo como sacrifício vivo agrada a Deus (Rm 12.1). Cuidarmos de nosso irmão mais fraco agrada a Deus (Rm 14.18). Obedecer nossos pais agrada a Deus (Cl 3.20). Ensinar a Palavra de forma autêntica agrada a Deus (1 Ts 2.4). Orar por autoridades de governo agrada a Deus (1 Tm 2.1-3). Sustentar familiares em necessidade agrada a Deus (1 Tm 5.4). Partilhar recursos financeiros com outros agrada a Deus (Hb 13.16). Agrada a Deus quando guardamos os seus mandamentos (1 João 3.22). Em linhas gerais, sempre que você confia em Deus e o obedece, ele se agrada disso.[2]

Pensamos ser marca de sensibilidade espiritual considerar tudo que fazemos como moralmente suspeito. Mas essa não é a forma da Bíblia pensar acerca da justiça. Ainda mais importante, tal tipo de resignação não retrata a verdade acerca de Deus. A. W. Tozer está correto:

Um mundo de infelicidade sobrevém a bons cristãos até mesmo hoje, a partir de um falso entendimento de quem Deus é. Pensa-se na vida cristã como algo lúgubre, um carregar de cruz cuja monotonia não sofre solução de continuidade, sob os olhos de um Pai rígido que espera muito e nada desculpa. Ele é austero, rabugento, tremendamente temperamental e extremamente difícil de agradar.[3]

Mas esta não é a forma de se enxergar o Deus da Bíblia. Nosso Deus não é um capataz caprichoso. Não é hipersensível nem inclinado a ataques de raiva por causa da menor ofensa. Ele é tardio em irar-se e cheio de amor (Ex 34.6). “Ele não é difícil de agradar”, relembra-nos Tozer, “embora possa ser difícil de satisfazer”. [4]

Por que é que imaginamos um Deus tão indiferente diante de nossas sinceras tentativas de obedecer? Ele é, afinal de contas nosso Pai celeste. Que pai seria capaz de olhar para o cartão de aniversário feito pela filha e reclamar porque não gostou das cores? Que mãe haveria de dizer ao filho, depois deste limpar a garagem, mas colocar as latas de tinta nas prateleiras errada: “Isso tudo nada vale aos meus olhos”? Que tipo de pai ou mãe reage com impaciência diante do primeiro tombo do filho ao aprender a andar de bicicleta? Não há justiça que nos torne retos diante de Deus exceto pela justiça de Cristo. Mas para os que foram feitos retos diante de Deus exclusivamente pela graça mediante a fé, tendo, portanto, sido adotados na família de Deus, muitos de nossos atos de justiça não só não são imundos aos olhos de Deus, eles são doces, preciosos e agradáveis a ele.

[1] John Piper, Graça Futura (São Paulo, SP: Shedd Publicações, 2009), pág. 148
[2] Veja Wayne Grudem, “Pleasing God by Our Obedience”, em For the Fame of God’s Name: Essays in Honor of John Piper, ed. Sam Storms and Justin Taykir (Wheaton, IL: Crossway, 2010), pág. 277.
[3] A. W. Tozer, The Best of A. W. Tozer, Volume 1 (Grand Rapids, MI: Baker, 1978), pág. 121.
[4] Ibid.

Trecho do livro "A Brecha em Nossa Santidade" de Kevin DeYoung, publicado pela Editora Fiel



terça-feira, 3 de setembro de 2013

O argumento do Deus que é Pai



Quando falamos em salvação e perdição, grande parte dos cristãos se utilizam do seguinte argumento: "Como pode Deus, que é um Pai amoroso, permitir ou mandar alguns de seus filhos ao inferno? Que Pai faria isso?"

Mas a questão que deve ser observada é que, Deus não é Pai da humanidade em geral, Deus não é Pai daqueles que serão lançados no inferno, segundo a bíblia nos relata. Na verdade, Deus é Pai daqueles que são salvos, Deus é Pai dos cristãos genuínos, daqueles que fazem parte de seu rebanho.

As Escrituras nos dizem quem são os filhos de Deus, veja:

"Aquele que é a Palavra estava no mundo, e o mundo foi feito por intermédio dele, mas o mundo não o reconheceu.

Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam.

Contudo, AOS QUE O RECEBERAM, AOS QUE CRERAM EM SEU NOME, deu-lhes o direito de se tornarem FILHOS DE DEUS, os quais não nasceram por descendência natural, nem pela vontade da carne nem pela vontade de algum homem, MAS NASCERAM DE DEUS." João 1:10-13 (ênfase acrescentada)

Deus não é Pai de cristãos nominais, Deus não é Pai de ímpios e perversos, Deus não é Pai da igreja visível, mas da Igreja invisível.

O apóstolo João faz uma clara distinção entre aqueles que são filhos de Deus e aqueles que são filhos do diabo, isso mesmo, do diabo, veja:

"Desta forma sabemos quem são os filhos de Deus e quem são os filhos do diabo: quem não pratica a justiça não procede de Deus; e também quem não ama seu irmão." 1 João 3:10

O próprio Jesus se referiu a alguns judeus como sendo filhos do diabo, e não de Deus, veja:

"Disse-lhes Jesus: "Se Deus fosse o Pai de vocês, vocês me amariam, pois eu vim de Deus e agora estou aqui. Eu não vim por mim mesmo, mas ele me enviou... "VOCÊS PERTENCEM AO PAI DE VOCÊS, O DIABO, e querem realizar o desejo dele. Ele foi homicida desde o princípio e não se apegou à verdade, pois não há verdade nele." João 8:42,44 (ênfase acrescentada)

Como bem disse Driscoll: "não podemos deixar o nosso Jesus 'paz e amor' ser um substituto do Rei dos reis e Senhor dos senhores."

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Os altos e baixos da vida



Observem comigo estas duas passagens que têm como o mesmo autor o rei Davi:

“Em paz me deito e logo pego no sono, porque só tu Senhor me faz repousar com segurança.” Salmo 4.8 - Nesta passagem, o rei Davi rende graças a Deus por se deitar e logo pegar no sono. 

Agora, observem o contraste que encontramos dois salmos depois:

“Já estou cansado do meu gemido, toda a noite faço nadar a minha cama; molho o meu leito com as minhas lágrimas.” Salmo 6:6

Da noite de paz e sono tranquilo, Davi agora está comparando a sua cama como uma piscina de lagrimas, e a sua noite como períodos angustiantes.

É interessante ressaltar que não existem "super-crentes", que estão imunes as dificuldades da vida. Salomão nos diz que "tudo sucede igualmente a todos; o mesmo sucede ao justo e ao ímpio, ao bom e ao puro, como ao impuro..." (Ec 9:2). A diferença em relação ao ímpio e ao justo é que o justo possui Deus como o seu refúgio e fortaleza, como o seu "socorro bem presente na angústia." Sl 46:1

Se assim como Davi você vem enfrentando momentos de turbulência e de grande tristeza, não desamine, o mesmo Davi que enfrentou estes altos e baixos da vida, nos deixou um belo texto e um grande exemplo. Este mesmo Davi que escreveu o salmo 4 e o salmo 6, também escreveu o salmo 30, que no verso 5 nos diz que:

"O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã."

Davi termina o salmo 30 com as seguintes palavras:

"Mudaste o meu pranto em dança, a minha veste de lamento em veste de alegria, para que o meu coração cante louvores a ti e não se cale. Senhor, meu Deus, eu te darei graças para sempre." Salmos 30:11-12

E no salmo 6, que é o mesmo salmo onde Davi compara a sua cama como um leito de lágrimas, ele termina da seguinte maneira:

"O Senhor ouviu a minha súplica; o Senhor aceitou a minha oração. Serão humilhados e aterrorizados todos os meus inimigos; frustrados, recuarão de repente." Salmos 6:9-10

Dito isto, encerro este texto na certeza da soberania divina sobre todas as coisas. Como bem disse o pastor John Piper: "Os cristãos nunca se encontram em determinado lugar por acidente. Existem razões para as quais somos levados onde estamos."

Se animem, pois Ele mesmo prometeu estar conosco todos os dias, até a consumação dos séculos. Amém. Mateus 28:20