sábado, 7 de dezembro de 2013

Seis pontos de meu calvinismo



É claro que estou brincando – o calvinismo tem muito mais do que cinco ou seis pontos. Esses que vou citar são alguns dos que creio com respeito à salvação. E mesmo assim, nem todos os que se consideram calvinistas concordariam completamente comigo. Meu alvo é tentar esclarecer o que calvinistas, em geral, acreditam sobre a soberania de Deus e a responsabilidade humana. Não coloquei textos bíblicos, pois não quero provar nada – só explicar o que acredito como calvinista.


1 – Creio que Deus predestinou tudo o que acontece. O Deus que determinou todas as coisas é um Deus pessoal, inteligente, justo, santo e bom, que traçou seus planos infalíveis levando em conta a responsabilidade moral de suas criaturas. Ele não é uma força impessoal, como o destino. Portanto, as decisões que tomamos não são mera ilusão e nossa sensação de liberdade ao tomá-las não é uma farsa. Eu acredito que as nossas decisões e escolhas são bem reais e que fazem a diferença. Elas não são uma brincadeira de mau gosto da parte de Deus. De uma maneira para mim misteriosa, porém perfeitamente compatível com um Deus onipotente e infinito, ele consegue ser soberano sem que a vontade de suas criaturas seja violentada. Ao mesmo tempo, ao final, sempre prevalecerá aquilo que Deus já determinou desde a eternidade. Encaro essa relação entre a soberania de Deus e a responsabilidade humana como sendo parte dos mistérios acerca do ser Deus, como a doutrina da Trindade e das duas naturezas de Cristo

2 – Creio que Deus predestinou desde a eternidade aqueles que irão se salvar. Esta convicção não me impede de orar pelos descrentes e evangelizar. Ao contrário, evangelizo com esperança, pois Deus haverá de salvar pecadores. Creio que Deus já sabe, mas oro assim mesmo. Sei que ele ouve e responde, e que minhas orações fazem a diferença. Sei também que, ao final, através de minhas orações, Deus terá realizado toda a sua vontade. Não sei como ele faz isso. Mas, não me incomoda nem um pouco. Não creio que minha oração seja um movimento ilusório no tabuleiro da soberania divina.

3 – Não creio que Deus predestinou todos para a salvação. Da mesma forma, não creio que ele foi injusto e nem que ele fez acepção de pessoas para com aqueles que não foram eleitos. Não creio que Deus tenha predestinado inocentes ao inferno, pois não há inocentes entre os membros da raça humana. E nem acredito que ele tenha deixado de conceder sua graça a quem merecia recebê-la, pois igualmente não há pessoa alguma que mereça qualquer coisa de Deus, a não ser a justa condenação por seus pecados. Deus predestinou para a salvação pecadores perdidos, merecedores do inferno. Ao deixar de predestinar alguns, ele não cometeu injustiça alguma, no meu entender, pois não tinha qualquer obrigação moral, legal ou emocional de lhes oferecer qualquer coisa.

4 – Creio que Deus sabe o futuro, não porque previu o que ia acontecer, mas porque já determinou tudo que acontecerá. Por isso, entendo que a presciência de que a Bíblia fala é decorrente da predestinação, e não o contrário. Negar a predestinação e insistir somente na presciência de Deus com o alvo de proteger a liberdade do homem levanta outros problemas. Quem criou o que Deus previu? E, se Deus conhece antecipadamente a decisão livre que um homem vai tomar no futuro, então ela não é mais uma decisão livre.

5 – Creio que apesar de ter decretado tudo que existe desde a eternidade, Deus acompanha a execução de seus planos dentro do tempo, e se comunica conosco nessa condição. Quando a Bíblia fala de um jeito que parece que Deus nem conhece o futuro e que muda de ideia algumas vezes, é Deus falando como se estivesse dentro do tempo e acompanhando em sequência, ao nosso lado, os acontecimentos. É a única maneira pela qual ele pode se fazer compreensível a nós. Quem melhor explica isso é John Frame, no livro Nenhum Outro Deus, da Editora Cultura Cristã, que recomendo entusiasticamente.

6 – Creio que Deus é soberano e bom. A contradição que parece haver entre um Deus soberano e bom que governa totalmente o universo, por um lado, e por outro, e a presença do mal nesse universo é apenas aparente e, por enquanto, sem explicação. Diante da perversidade e dos horrores desse mundo, alguns dizem que Deus é soberano mas não é bom, pois permite tudo isto. Outros, que ele é bom mas não é soberano, pois não consegue impedir tais coisas. Para mim, a Bíblia diz claramente que Deus não somente é soberano e bom – mas que ele é santo e odeia o mal. Ao mesmo tempo, a Bíblia reconhece a presença do mal do mundo e a realidade da dor e do sofrimento que esse mal traz. Ainda assim, não oferece qualquer explicação sobre como essas duas realidades podem existir ao mesmo tempo. Simplesmente afirma ambas e pede que vivamos na certeza de que um dia Deus haverá, mediante Jesus Cristo, de extinguir completamente o mal e seus efeitos nesse mundo.

Deve ter ficado claro que um calvinista, para mim, é basicamente um cristão que aceita o que a Bíblia diz sobre a relação entre Deus e o homem e reconhece que não tem todas as explicações para as questões levantadas. Para muitos, esse retrato é de alguém teologicamente fraco e no mínimo confuso. Mas, na verdade, é o retrato de quem deseja calar onde a Bíblia se cala.

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